A política de cotas foi promulgada pela Lei nº 12.711/2012. A lei estabelece que 50% das vagas de todas as instituições federais de ensino superior e técnico devem ser destinadas às pessoas oriundas das escolas públicas. Além disso, das vagas reservadas, metade delas devem ser destinadas às pessoas com renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo e devem ser preenchidas prioritariamente por pessoas negras e indígenas respeitando a proporção da população negra e indígena que vive na unidade da federação na qual a instituição se encontra.
Como funciona na prática?
Vamos imaginar hipoteticamente que na unidade da federação na qual se encontra a instituição de ensino a população seja formada da seguinte forma:
56% negros/pardos
43,9% brancos
0,01% indígenas
Neste caso, do total de vagas (100%) metade seriam reservadas para cotas e, respeitando as devidas proporções, teríamos:
25% do total das vagas reservados para candidatos oriundos de escola pública e com renda per capita maior que 1,5 salários mínimos.
25% do total das vagas destinadas aos candidatos oriundos das escolas públicas e com renda per capita de até 1,5 salários mínimos (14% para pessoas negras/pardas, 0,0037% para indígenas, e 11% para pessoas brancas).
É constitucional?
Uma das principais críticas feitas à Lei nº 12.711/2012 é que ela seria inconstitucional pois fere o artigo 5º da Constituição Federal, que afirma a igualdade de todos perante a lei. Entretanto, é importante lembrar que a mesma Constituição em seu artigo 3º fala sobre a promoção da igualdade real por meio da promoção de ações que erradiquem a pobreza, a marginalização e as desigualdades sociais.
De acordo com o Laboratório de Políticas Públicas da UERJ:
Na visão, entre outros juristas, dos ministros do STF, Marco Aurélio de Mello, Antonio Bandeira de Mello e Joaquim Barbosa Gomes, o princípio constitucional da igualdade, contido no art. 5º, refere-se a igualdade formal de todos os cidadãos perante a lei. A igualdade de fato é tão somente um alvo a ser atingido, devendo ser promovida, garantindo a igualdade de oportunidades como manda o art. 3º da mesma Constituição Federal.
Há necessidade de cotas?
As cotas fazem parte das políticas afirmativas que visam reparar uma situação de desigualdade e injustiça social. Será que há mesmo necessidade de cotas? Vamos analisar o caso mais polêmico e paradigmático da lei de cotas. Vejamos o caso das cotas raciais.
De acordo com dados do IBGE mais da metade da população brasileira (54%) são pessoas pretas ou pardas. Entretanto, embora sejam maioria numérica, os negros vivem em condições mais precárias e em desvantagem quando comparados com a população branca. Isso é consequência do acumulo histórico de violências e violações praticadas no Brasil contra a população negra.
De acordo com dados da ONG britânica Oxfam, no ano de 2015 enquanto os brasileiros brancos ganhavam em média R$ 1.589,00 mensais, a renda média mensal dos negros era de R$ 898,00 (pouco mais da metade da média dos brancos). Além disso, a taxa de desemprego é maior entre os negros (14,6%) do que entre os brancos (9,9%).
Dados do Atlas da violência de 2017 mostram que a cada 100 pessoas assassinadas no Brasil 71 são negras. Os negros correspondem a 78,9% do total de indivíduos com maiores chances de serem vítimas de morte violenta. Além disso, 61,6% dos presos no Brasil são negros.
Já no campo da produção cultural, somente 10% de todos os livros lançados no Brasil entre os anos de 1965 e 2014 foram escritos por negros. Na literatura nacional 60% das personagens protagonistas são homens e 80% deles são brancos. Só 2% dos diretores de cinema no Brasil são negros e apenas 4% dos roteiristas são negros.
Foi para minimizar os efeitos de séculos de racismo que foram criadas as políticas afirmativas (como é o caso das cotas raciais). Elas são políticas focais que concentram recursos e esforços para reparar ou diminuir a desigualdade dos vitimados pela exclusão socioeconômica.
É importante ressaltar que as políticas afirmativas não dão a esses grupos mais direitos. Ao contrário, tais ações visam garantir que as pessoas dos grupos mais vulneráveis possam acessar direitos já consolidados em outros segmentos sociais. Além disso, tais medidas visam aumentar a participação política dos grupos vulneráveis.
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